Por Priscila Horvat*
O ano de 2024 terminou com uma esperança para a comunidade azul: a aprovação, no Senado, do Projeto de Lei (PL 2687/2022) que concedia a quem tem o tipo 1 da doença (DM1) os mesmos direitos de pessoas com deficiência (PCD) previstos no Estatuto da Pessoa com Deficiência. O PL seguiu para aprovação presidencial e, nessa segunda-feira (13 de janeiro), o presidente Luís Inácio Lula da Silva vetou o projeto. Na visão de muitos pacientes, familiares, profissionais de saúde e instituições médicas, o veto do presidente é um retrocesso na luta pelos direitos das pessoas com diabetes.
A decisão foi publicada na edição do Diário Oficial da União dessa segunda-feira (13). A justificativa para tal decisão foi que a Presidência da República ouviu o Ministério da Fazenda, o Ministério do Planejamento e Orçamento, o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, o Ministério da Saúde e a Advocacia-Geral da União (AGU) e que, apesar “da boa intenção do legislador, a proposição legislativa viola o art. 5º, § 3º, da Constituição, por contrariar a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, que possui status de emenda constitucional e reconhece que a deficiência resulta da interação entre a pessoa e as barreiras sociais, e não de uma condição médica específica”.
Além disso, segundo o governo, o projeto cria uma despesa obrigatória sem apresentar uma fonte financeira para ela: “A proposição legislativa também incorre em vício de inconstitucionalidade ao violar o art. 167, § 7º, da Constituição e o art. 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, os quais exigem, na hipótese de criação ou alteração de despesa obrigatória ou renúncia de receita, a apresentação de estimativa do impacto orçamentário-financeiro correspondente e previsão de fonte orçamentária e financeira necessária à realização da despesa ou previsão da correspondente transferência de recursos financeiros necessários ao seu custeio. Ademais, há violação ao princípio da precedência da fonte de custeio, previsto no art. 195, § 5º, da Constituição, que exige a existência de fonte de custeio para a criação, majoração ou extensão de benefício ou serviço da seguridade social”.
Ao concluir sua argumentação, a Presidência reitera que “a proposição contraria o interesse público ao classificar o diabetes tipo 1 como deficiência sem considerar a avaliação biopsicossocial, que percebe os impedimentos da pessoa em interação com o meio, em conflito com a Convenção Internacional supracitada. Além disso, a proposição resultaria em aumento de despesa obrigatória de caráter continuado, sem que tenha sido apresentada estimativa de impacto orçamentário e indicada fonte de custeio ou medida de compensação, em descumprimento aos requisitos da legislação fiscal”.
A proposta, que já havia sido analisada e aprovada na Câmara dos Deputados, foi aprovada pela Comissão de Assuntos Sociais (CAS) do Senado em audiência no dia 11 de dezembro.
Pelas redes sociais, o senador Alessandro Vieira (MDB-SE), que foi o relator do projeto na CAS, lamentou a decisão e defendeu a derrubada do veto pelo Congresso Nacional.
“O presidente Lula vetou o projeto aprovado pelo Congresso que equipara pessoas com diabetes tipo 1 a PCD (pessoas com deficiência). É lamentável que o governo escolha fazer economia burra às custas de quem mais precisa. Vamos agora trabalhar pela derrubada do veto, pois esse é um projeto justo e necessário”.
Para que um veto seja derrubado, é necessária a maioria absoluta dos votos de deputados federais e senadores – ou seja, 257 votos de deputados e 41 votos de senadores em sessão do Congresso Nacional.
Segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), estima-se que, no Brasil, cerca de 5% a 10% das pessoas que vivem com DM1, doença autoimune na qual o pâncreas para de produzir completamente a insulina. Esse montante equivale a aproximadamente 600 mil pessoas. Em nota, o presidente da SBD, Dr. Ruy Lyra, comentou a decisão do presidente Lula: “A nossa surpresa e indignação se refere aos argumentos apresentados para o veto” e afirmou que a entidade continuará lutando para a aprovação do PL. “Entraremos em tratativas não somente com parlamentares, como também com fontes do governo para tentar dirimir dúvidas e reverter o veto do Presidente.”
Com o diagnóstico de DM1, os pacientes precisam administrar insulina várias vezes por dia e, assim, conseguir controlar os níveis de glicose no sangue. Até o momento, não existe cura para o DM1 e os pacientes lidam com diversos desafios que nem sempre são visíveis para outras pessoas.
*Priscila Horvat é jornalista com foco em saúde e integra a equipe da Momento Diabetes.