Por Priscila Horvat*
Após o impacto inicial de receber o diagnóstico do diabetes, cada pessoa reage de uma forma. Há aqueles que imediatamente já querem começar o tratamento e saber mais sobre a doença. Outros não aceitam e resolvem ignorar por mais um tempo, até os sintomas começarem a incomodar no dia a dia, e existe a terceira parcela, que compreende os indivíduos que aceitam a condição, mas sofrem demais com a carga emocional que vem com ela.
Esse aspecto é chamado de diabetes distress. A palavra, que está em inglês, quer dizer sofrimento. “Diabetes distress é o sofrimento emocional específico que pessoas com diabetes tipo 1 ou tipo 2 sentem ao lidar com a carga diária do manejo da condição. Envolve preocupações constantes com o controle da glicemia, o medo de complicações futuras, frustrações com mudanças na rotina e a sobrecarga com as demandas de tratamento”, conta o psicólogo cognitivo-comportamental e educador em diabetes Mário Márcio.
De acordo com o especialista, diferentemente de depressão ou ansiedade clínica, o diabetes distress está diretamente relacionado aos desafios do autocuidado e pode afetar a adesão ao tratamento.
É importante esclarecer que, apesar do termo parecer se referir a um tipo da doença, o diabetes distress não é um tipo de diabetes e tampouco está catalogado como um transtorno. “Ele é reconhecido como um estado emocional relacionado ao manejo do diabetes, mas não se qualifica como um transtorno mental independente, como a depressão ou transtornos de ansiedade, por exemplo, mas, sim, como um estado emocional ou uma reação psicológica específica às exigências diárias do manejo do diabetes”, ressalta Mário, que tem diabetes tipo 1 desde 2006.
Sintomas
O diagnóstico é feito com base em questionários padronizados que medem a escala de diabetes distress, disponibilizada pela Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), que avalia alguns critérios e classifica cada item de acordo com a intensidade e frequência.
“O objetivo não é atribuir mais um diagnóstico ou rotular a pessoa com mais uma doença ou transtorno, mas indicar os aspectos que aquele paciente mais precisa de ajuda”, afirma Mário Márcio. Entre os sintomas mais comuns associados ao diabetes distress, estão:
- Não adesão ao tratamento, ou seja, não medir a glicemia, reduzir ou não fazer as aplicações de insulina;
- Frustração;
- Sentimento de sobrecarga física e mental;
- Desânimo e cansaço;
- Falta de suporte social e familiar;
- Culpa e preocupação excessiva com complicações.
“Somente essas manifestações já representam a necessidade de atenção, pois tem um grande potencial de prejudicar o manejo da glicemia e aumentar o risco de futuras complicações”, revela Márcio.
Tratamento
O profissional explica que existem algumas opções para lidar com o diabetes distress:
- Psicoterapia: de preferência a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC), pois é a abordagem com mais evidências para o tratamento, principalmente em pessoas com ansiedade e depressão, sintomas associados ao diabetes distress. Melhor ainda se o profissional estiver familiarizado com o diabetes, para identificar pontos específicos que geram mais ansiedade, e trabalhar junto à psicoterapia com intervenções de psicoeducação e educação em diabetes.
- Educação em diabetes: desenvolver o autocuidado a partir do conhecimento ajuda a reduzir a ansiedade, aumenta a sensação de ter alguma previsibilidade e melhora a relação de aceitação com a condição.
- Suporte social: família, grupos de pessoas com diabetes, contato com profissionais de saúde e grupos de apoio em psicoterapia podem ser ambientes seguros em que haja identificação, trocas saudáveis de experiências, informações, conhecimentos e apoio emocional.
Para quem quiser saber mais sobre o assunto, o psicólogo indica o site da SBD e da Associação Americana de Diabetes (ADA) como fontes confiáveis de consulta. Em seu perfil nas redes sociais, o profissional também aborda o tema com linguagem acessível. “Para profissionais de saúde, um bom artigo de referência, além das publicações da SBD, é o ‘Diabetes Distress but Not Clinical Depression or Depressive Symptoms Is Associated With Glycemic Control in Both Cross-sectional and Longitudinal Analyses’, da ADA, que examina a relação entre Diabetes distress e o controle glicêmico, diferenciando-o de outras condições, como depressão, e é um bom ponto de partida para entender as nuances do diagnóstico”.
Hemoglobina glicada
É importante lembrar que existe uma ligação direta entre o diabetes distress e a hemoglobina glicada. “Quando há ocorrência de sofrimento, com sintomas como a dificuldade de adesão ao tratamento, há um aumento da hemoglobina glicada por consequência”, explica Mário.
O psicólogo ressalta que é muito importante que não haja preconceito ou se reduza a importância dos fatores psicológicos e emocionais da condição. “Não é frescura ou fraqueza, e eles são tão importantes quanto os fatores físicos que se pode observar com exames”, finaliza.
O manejo emocional e psicológico faz parte das diretrizes de manejo de condições crônicas segundo associações como a ADA e a Organização Mundial da Saúde (OMS). Como o diabetes distress pode ter sintomas depressivos e até evoluir para um quadro de depressão maior, é importantíssima a orientação individualizada por um profissional de saúde mental.
*Priscila Horvat é jornalista com foco em saúde e integra a equipe da Momento Diabetes.